Monday 6 June 2011

RR (Augusto do Rosário Rodrigues?) - Mestre Zé António (1955)

O mar começara a encapelar-se e a frágil embarcação era atirada qual casca de noz sobre a crista espumante das ondas.

O patrão, mestre Zé António, como a bordo lhe chamavam, de pé à popa, agarrava a cana do leme com braço firme e de peito desnudado ao vento, olhando a linha do horizonte e passando, momentos a momentos, a vista pela velha bússola, para manter o rumo.

Quando a boca escancarada da vaga, se preparava no seu encapelamento para engolir a embarcação, uma guinada de leme, e lá estava a proa a cortá-la como um cutelo afiado do carrasco a separar a mais bela cabeça de mulher.

A noite, avizinhava-se, e o vento forte obrigava as nuvens negras a afastarem-se num galope desordenado levando o perigo para outros lados. No entanto mestre “Zé António” mantinha-se firme no seu posto de manobra.

De vez em quando fazia ouvir a sua voz forte e resoluta de marinheiro, ordenando:

- Eh, Manel, e caça a vela pequena!

-Eh, Chico, olha aquele cordame que está à proa não vá o mar leva-to!...

E todos cumpriam prontamente sem temor nem receio do perigo que corriam, pois sabiam que ele, o mestre Zé António, era um valente, que em muitas ocasiões idênticas tinha mostrado quanto valia, levando sempre a bom cabo a sua embarcação e a vida dos seus homens.

- A borrasca vai continuar! – gritava Chico...

Mestre Zé António, a este brado, olhou o céu. Os seus cabelos e as suas barbas brancos como o algodão, tão velhos como ele na experiência do mar davam-lhe um ar patriarcal. E deixou transparecer um sorriso, pois já sabia que o mau tempo tinha passado.

O manto da noite cobriu por completo o dia tenebroso, mas agora o tempo amainava lentamente, a calma surgia pouco a pouco, e as ondas vinham quebrar-se de encontro à embarcação num marulhar... numa carícia inocente, e num abraço de amizade, que não fazia chorar o seu cavername como antes. E assim embalada docemente entrou na pequena baía do destino, onde a água foi fendida pela âncora que sofregamente foi repousar no fundo do mar.

Depois de velas enroladas e do cordame arrumado, mestre Zé António desembarcara na praia, com o seu casaco ao ombro e cachimbo na boca. Aguarda-o a sua Rosa, companheira do destino, herança dada por Deus.

- Então Zé, o mar esteve mau?

- Não Rosa, foi uma ligeira borrasca...

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